Autora: Paula Pimenta
Editora: Galera Record
Ano: 2015
Páginas: 160
Gênero: Juvenil

Resenha por: Luísa
Nota: ★★
Nessa versão estendida do super conto de Paula Pimenta no Livro das Princesas, Cinderela é reinventada. Cintia é uma princesa dos dias atuais: antenada, com opiniões próprias, decidida e adora música! Mas a garota vê seu cotidiano virar de cabeça para baixo depois da separação dos pais: vai morar com a tia, se afasta do pai e, principalmente, deixa de acreditar no amor. Até que um encontro inesperado e revelador a faz rever as próprias escolhas - havia mesmo um belo príncipe em sua história, e tudo que ele mais queria era descongelar o coração da nossa gata (nada) borralheira!

Cinderela pop é um livro extremamente fofo e divertido. É narrado em primeira pessoa e tem uma leitura bem fácil, em algumas horas eu o devorei completamente. Cintia era uma menina feliz e extrovertida, vivia no em um lugar bom, confortável e com uma ótima vista da cidade. No entanto, sua vida mudou da noite para o dia quando sua mãe recebeu uma oferta de emprego fora da cidade, bom, no Japão. E sim, ela largou tudo para agarrar essa oportunidade. 
Depois de pegar seu pai traindo a mãe com sua secretária, Cintia pegou todas as dores dela e passou a se sentir traída pelo pai, resultando na desilusão em relação ao amor e relacionamentos duradouros. A garota passou a morar com a tia, irmã de sua mãe, que era um tanto exótica, era desenhista e muito bagunceira. Mas, por um lado ter deixado de morar no apartamento clean de detalhista foi até que bom, já que ela pode ser mais livre para ir para as festas. Não que ela fosse baladeira ou algo do tipo, muito pelo contrário, ela gostava de trabalhar como DJ. E, inclusive, sem ao menos saber, Cintia foi contratada para tocar na festa de quinze anos das filhas da nova namorada do seu pai, festa que ela também tinha sido convidada. O inesperado vai acontecer a sua vida vai mudar mais ainda depois dessa festa. 

Eu recomendo muito esse livro para quem gosta de contos de fadas modernos, Paula Pimenta tem seu jeito especial de tratar suas histórias e isso torna tudo mais especial. Minha nota é cinco estrelas e um coração.


Oi! Hoje, quero compartilhar com vocês um artigo que fiz há um tempo atrás, voltado principalmente aos educadores. Penso que as reflexões contidas nele, bem como sugestões de atividades podem contribuir na sua caminhada!


BULLYING, NÃO! APRENDENDO COM AS DIFERENÇAS

Leila de Souza Mello

Trabalho na Escola Estadual de Ensino Fundamental Marechal Emilio Luiz Mallet, localizada na periferia da cidade do Rio Grande (RS) há 19 anos. Neste ano, recebi uma turma de 1º ano, com apenas dezesseis alunos, mas com muitos desafios. Verifiquei, inicialmente vários problemas de bullying e agressividade e isto dificultou a constituição da turma, como um todo, além de interferir, ao longo do ano letivo, na aprendizagem dos educandos.
Ao observar que a agressividade e o bullying parecem ser normais no dia a dia da escola e da comunidade, da qual os estudantes fazem parte, decidi que deveria começar este projeto: “Bullying, não! Aprendendo com as diferenças”. Percebi que a dificuldade de entender ou aceitar outras opiniões, outras orientações sexuais, outras religiões, enfim, a dificuldade de respeitar as diferenças inerentes aos seres humanos levava a brigas, agressões verbais ou até mesmo físicas. Muitas crianças traziam falas de seus pais que os incentivam à agressividade, entre elas: “não levar desaforo para casa”; os próprios colegas também encorajavam atitudes de deboche, de racismo, de homofobia, de revide e de vingança.
Incomodada, não podia mais me furtar à responsabilidade de educadora, por isso, procurei fazer tudo que estava ao meu alcance para, no mínimo, abrandar o problema. Embora a agressividade e o bullying tenham origem externa aos muros da escola, acabam por penetrála, por isso meu objetivo era, sensibilizar os educandos, tornando-os, agentes transformadores do meio e do entorno. Também gostaria de salientar que este é um projeto inserido num maior, que é de toda escola: “Vivenciando o amor e a paz”.
Foi diante de tal realidade escolar, surgiu este projeto, que defende a importância de se abordar o bullying na escola, com o objetivo de chegar às famílias, tendo em vista que muitas situações que aparecem na mídia, sem reflexões críticas sobre possíveis causas do fenômeno, que sempre existiu em nosso país e em outros, acabam por banalizar este problema.
A proposta foi possibilitar diversas situações que levassem os alunos a uma reflexão, para que se conscientizassem da necessidade da aceitação e do respeito às diferenças, buscando uma mudança comportamental que levará a uma melhor convivência dentro ou fora do ambiente escolar.
A partir disso, desejava atingir diretamente cada aluno, envolvendo-os na discussão desta problemática, com o objetivo maior de alcançar os pais, buscando uma mobilização socioeducacional e a consciência da necessidade de se promover continuamente a cultura de prevenção contra a violência.
Comecei o projeto através das histórias do filme Cine Gibi da Turma da Mônica (dois). Refleti, junto com os alunos, sobre as atitudes dos personagens da Turma da Mônica.
Eles mesmos concluíram que a Mônica não estava agindo bem quando batia nos seus amigos e também declararam que não deveriam tê-la “ofendido”, chamando-a de baixinha, dentuça, gorducha. Além disso, as crianças observaram o problema de fala do Cebolinha, os hábitos de higiene do Cascão, os hábitos alimentares da Magali, o diferente estilo de vida do Chico Bento. Igualmente, concluíram que não devemos julgar ninguém pelas aparências, após ver a história do filme: “O Baile Frank”. Vários alunos foram fazendo comparações entre personagens do filme e os colegas da turma. Escrevi um texto coletivo, elaborado pelos alunos, com o entendimento do filme. Apresentei um Glossário Alfabetizador com os desenhos dos personagens do filme e seus nomes. Os educandos puderam, com a ajuda desse glossário, identificar palavras no texto coletivo. Cada aluno recebeu, mais tarde, uma cópia da referida redação, na qual fizemos uma série de explorações, como: pintar os espaços entre as palavras, jogar o PIM(Neste jogo, todos devem ler o texto, oralmente, e em cada espaço entre as palavras, todos devem dizer PIM.), com os espaços do texto, sublinhar palavras do glossário, identificar palavras que começavam com a inicial do seu nome, etc.
Realizávamos diariamente a leitura desse glossário, de diferentes maneiras: num dia liam todos juntos, noutro, liam, primeiro, quem torce pelo Inter e, depois, quem torce pelo Grêmio; a seguir, liam e tinham que fazer algo que caracterizasse a palavra lida, etc. Também fazíamos o jogo do “PIM”, com as vogais das palavras do glossário. Fiz dos jogos, meus aliados, no processo de alfabetização, pois acredito no que aponta PIAGET (1994:25):
“um processo de ajuda ao desenvolvimento da criança; acompanha-a,
sendo, ao mesmo tempo, uma atividade consequente de seu próprio
crescimento”.
Afirma Piaget que o jogo proporciona à criança viver momentos de colaboração, competição e também de oposição, ensinando-as a conhecer regras, respeitar o companheiro e aumentar os contatos
sociais, ajuda ainda na superação do egocentrismo. O jogo oportuniza o desenvolvimento motor da criança, permitindo que ela crie e monte seus próprios jogos melhorando as suas habilidades, motivando-a também a ultrapassar seus limites.
Através do jogo estamos desenvolvendo todas estas atitudes, habilidades, competências, além de penetrar no universo das crianças, como diz ALVES(1994:26):
“O jogo traz a visão do futuro. O jogo tem a visão do futuro em
primeiro lugar por que seu espírito criativo está nas origens da
humanização. Em segundo lugar porque está vinculado à criança e ao
espírito infantil.”
Utilizei um baralho confeccionado com as palavras nas letras script e cursiva, letra inicial e figuras do glossário, para diferentes jogos como: lince, mico, memória, dorminhoco e cartelas com as palavras do glossário para jogar bingo de letras e de palavras. Também foi preparado um envelope com uma figura e todas as letras que formavam a palavra contida no envelope, para fazer o bingo ao contrário. Soma-se a isso a organização do jogo do coração, o dominó e o jogo do Boole, todos com as figuras e palavras do glossário. Outra “diversão” oferecida foi o VERITEK (um jogo como o de relacionar colunas. Ele é composto de uma caixa na qual seu fundo é numerado de 1 a 12 e contém 12 peças com desenhos geométricos coloridos. É entregue uma ficha com 12 perguntas e o objetivo do jogo é associar corretamente o número da pergunta com o número da resposta. Os números pintados no fundo da caixa correspondem às perguntas e as peças, às respostas. Se tudo estiver correto, ao virar a caixa para baixo, as peças formarão um desenho, que está na ficha de perguntas). Após cada jogo, sempre, era proporcionada uma ficha didática, com atividades, para que os alunos não jogassem apenas por jogar, com objetivos apenas lúdicos, mas com um fim pedagógico.
Os jogos eram realizados nos grupos, alguns eram de competição e outros de cooperação e acabaram por desenvolver várias habilidades e competências.
Diariamente eu realizava a contação de uma história com uma temática e/ou uma potencialidade simbólica coerente com a proposta do projeto. Após discutíamos sobre a leitura realizada e fazíamos produções, às vezes em pequenos grupos, em grande grupo ou individualmente, respeitando o pensamento de cada um. Os livros circulavam pelos grupos para que cada aluno pudesse realizar a sua leitura, de acordo com seu pensamento. Por vezes, dramatizávamos a historinha.
"(...) a criança que ainda não se alfabetizou, mas já folheia livros,
finge lê-los, brinca de escrever, ouve histórias que lhes são lidas, está
rodeada de material escrito e percebe seu uso e função, é analfabeta,
pois ainda não aprendeu a ler, mas já entrou no mundo do letramento,
e já é de certa forma letrada”. (SOARES, 2006, p. 24)

Assim, líamos e trabalhávamos com as histórias dos livros da coleção “Bullying na Escola”; o livro: “Por que meninos têm pés grandes e meninas têm pés pequenos?”; “Branquinho, o Dognauta”; “O fusquinha cor de rosa”. Eu escutava as falas dos educandos, seu entendimento e argumentos e mediava as discussões, salientando sempre o respeito às diferentes opiniões.
Foucaubert (FOUCAUBERT, 1994, p. 37) diz que “aprende-se a ler
lendo textos que não se sabe ler, mas que são necessários para
responder as perguntas que fazemos”.
Como vimos, na visão de Vygotsky (1998), a cultura impregna nosso
modo de pensar, sentir e aprender. Compreendendo a cultura como os
modos de um povo, comunidade ou grupo fazer, ver, ser, sentir e estar
no mundo e, portanto, como um sistema de significação, não podemos
percebê-la como algo pronto e estático, e sim como um processo
dinâmico construído pelos diferentes grupos culturais aos quais
pertencemos. Esses sistemas de significação ou sistemas simbólicos
constituem e são, ao mesmo tempo, os meios pelos quais
transmitimos e comunicamos, uns para os outros e para nós mesmos,
as ideias e os sentidos compartilhados do mundo cultural no qual
estamos inseridos. Assim, as formas particulares de linguagem (a
palavra, o gesto, a arte e o desenho, dentre outros) são instrumentos de
apropriação da cultura pelas crianças, permitindo-lhes a decifração do
mundo e, consequentemente, orientando suas ações e suas
manifestações sobre o meio em que vivem."
Minha pretensão com estas leituras e reflexões era despertar a consciência, procurando diminuir os preconceitos que os educandos “carregavam”, mostrar outras opiniões, gostos, culturas, religiões, preferências. Observamos que muitos hábitos mudam, de acordo com a cultura, o contexto ou o tempo e o que nos parece estranho, diferente ou errado, noutro tempo ou lugar é normal. Pretendia oportunizar um crescimento e um aprendizado com estas diferenças. Buscava uma mudança no pensamento dos educandos que posteriormente, se refletisse nas suas atitudes. Tentava transformá-los. Como falou Magda Soares
Educação é, por definição, um processo dirigido a objetivos. Só
vamos educar os outros se quisermos que eles fiquem diferentes, pois
educar é um processo de transformação das pessoas.
Na história: “Branquinho, o dognauta”, o personagem principal era uma cachorrinho que viera de outro planeta. Ele tinha os olhos e a boca na nuca e o rabo era ao lado do corpo. Quando chegou aqui, os veterinários quiseram operá-lo, para “arrumá-lo”. Depois, um deles dirigiu-se ao planeta do Branquinho e lá, os dognautas queriam operá-lo e “consertá-lo”, pois, lá, ele era o diferente. Esta história trouxe muitas reflexões sobre a nossa dificuldade de entender, respeitar e aceitar as diferenças e nosso desejo de mudar as pessoas que pensam ou agem diferentemente do que consideramos certo. Todos brincaram com o dognauta, que “foi nos visitar”, procurando aceitá-lo como ele era, respeitando-o.
Nesta dinâmica, todos os dias, tínhamos leituras, escritas, reflexões, discussões, jogos e fichas didáticas que possibilitavam um desenvolvimento da competência linguística das crianças, tanto oral quanto escrita. Mas não era só isto! Sou também professora de Matemática e esta minha outra paixão faz, naturalmente, que eu procure proporcionar a construção de habilidades e
competências, dessa disciplina. Assim, fomos trabalhando, através de jogos, de brincadeiras e material concreto, de atividades de seriação, classificação, inclusão, conservação, comparação, localização espaço/tempo, escrita, leitura e contagem de numerais, problemas e construção de gráficos.
Construímos o Jogo do Boole da Turma da Mônica e, com as histórias, desenvolvemos o raciocínio lógico. Também fizemos o “jogo da velha”, com o Cebolinha e a Mônica. Realizamos vários problemas, como o que ilustro a seguir, do meu aluno “desenhista”:

Os problemas não tinham apenas o objetivo de realizar uma operação matemática, mas o de provocar uma reflexão maior. O exemplo acima suscitou uma discussão sobre egoísmo, justiça e amizade. Quando o pensamento foi justiça, várias opiniões foram expostas, pois nem sempre justiça é fazer uma divisão igual entre todos, mas, sim, dar mais a quem precisa de mais e, menos a quem já tem muito... Deixava que os educandos levantassem suas hipóteses, buscassem caminhos e possíveis soluções e eu apenas fazia algumas intervenções e permanecia atenta aos pareceres, não só das questões da aprendizagem Matemática, mas também aos conceitos, sentimentos e olhares dos educandos para os problemas de ordem moral e ética, baseada no que alerta Kátia Smole:
Segundo Smole, (2000, p.136): "O trabalho do professor, não consiste em
resolver problemas e tomar decisões sozinho. Ele anima e mantém as redes de
conversas e coordena ações. Sobretudo, ele tenta discernir, durante as
atividades, as novas possibilidades que poderiam abrir-se à comunidade da
classe, orientando e selecionando aquelas que não ponham em risco algumas de
suas finalidades mais essenciais na busca por novos conhecimentos."
Procurava trabalhar com problemas contextualizando-os com a temática e a realidade dos alunos para que fizessem sentido para eles, no intuito que um maior entendimento das situações-problema, trouxessem uma maior aprendizagem. Nesta direção, PANIZZA diz que:
“A palavra ‘sentido’ parece estar cada vez mais presente nas
preocupações dos professores sobre o ensino da matemática. ‘Como conseguir
que os alunos encontrem o sentido da atividade matemática?’, ‘Os alunos agem
mecanicamente sem dar sentido ao que fazem’, entre outras, são expressões
habituais dos professores. A palavra ‘sentido’ parece explicar intenções,
conquistas e frustrações. No entanto, questões como qual significado se atribui
à palavra, onde se encontra o sentido, se é algo que o docente dá ou o aluno
constrói e em que condições, longe de serem claras e compartilhadas,
comportam profundas diferenças e contradições”. (PANIZZA, 2006, p. 19,
grifos do autor).
A partir de situações trazidas pelas falas dos educandos, construía os problemas, para que pertencendo a realidade deles, fizessem sentido e fossem melhor compreendidos. Um questionamento frequente e importante para eles era: em que grupo havia o maior número de pessoas: o das meninas ou dos meninos? Diariamente eles levantavam esta questão e perguntavam: os meninos ou as meninas “venceram”? Essa manifestação surgia após terem contado o número de meninas e o número de meninos e comparavam para concluir qual era mais numeroso. Desafiei-os, então, a responder quantos a mais havia no grupo “vencedor”.
Essa questão não foi bem compreendida pela grande maioria da turma, mas quando uma menina deu a resposta exata, perguntei como ela tinha chegado ao exato resultado, ao que ela respondeu, explicando para toda turma: “primeiro eu vi o que tinha de igual, depois contei apenas os outros que tinham sobrado, entendeu? Fiz os pares, quem ficou sem par é que está a mais!” E assim, toda turma começou a fazer pares para, além de comparar quantidades, dizer quanto um(a) tem a mais que outro(a). E a ideia se estendeu, não só para ver quantos meninos tem a mais que as meninas ou vice-versa, mas, como, por exemplo, num gráfico que construímos, após uma pequena entrevista sobre qual era a fruta preferida entre os alunos da nossa sala de aula. Depois que eles verificaram que a maioria preferia o morango, começaram as questões: e quantos a mais preferem o morango à laranja? E quantos a mais preferem banana à laranja?
Hoje sei que minhas expectativas em relação ao desenvolvimento deste projeto eram muito grandes. Queria que os resultados aparecessem imediatamente após a contação e reflexão de uma história analisada. Também tive que trabalhar em mim o respeito à educação que cada aluno tinha recebido nos seus seis primeiros anos de vida e entender e aceitar que não conseguiria, de uma hora para outra, realizar grandes mudanças no pensamento deles. Era necessário respeitar o tempo de cada um. Entretanto, constatei, embora pequenas, significativas transformações! .Desta forma conforme Freire:
"O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto
estético, a sua inquietude, a sua linguagem (...) tanto quanto o professor que
se exime do cumprimento de seu dever de propor limites à liberdade do
aluno, que se furta ao dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à
experiência formadora do educando, transgride os princípios éticos de nossa
existência." (p.66)
Todos estavam mais dispostos a entender o que um aluno, com um problema expressivo de fala, dizia e ninguém mais implicou com seu modo de falar. Verifiquei que, em alguns momentos, procuravam ajudá-lo a falar corretamente, mas sem as risadas e deboches assíduos.
Outrossim, observei que alguns até continuaram se afastando de um coleguinha, que, pelo fato de a família trabalhar com a coleta de lixo seletiva, vinha para aula com um cheiro não muito agradável, mas mudaram tal comportamento e deixaram de apelidá-lo e ofendê-lo..
Foi clara também a seguinte constatação: logo após agredirem verbal ou fisicamente um colega, paravam para pensar, conversavam, pediam desculpas, mesmo que, daí algum tempo, voltassem a ser agressivos. Alguns pensavam um pouco mais e eu percebia que me olhavam e procuravam se controlar para não agredir mais seus colegas.
O fato que mais me emocionou foi o de um menino que apresentava, na fala, nos gestos, enfim, no comportamento, tendências homossexuais. Ele procurava sempre e apenas as meninas para brincar com as bonecas e demais brinquedos ditos femininos. No início, os meninos chamavam-no de “boiola” e outros termos pejorativos, queriam bater nele, demonstrando homofobia. Nas brincadeiras com as bonecas, ele não se colocava como o pai, mas como a mãe. Certa vez, fizeram um casamento das Barbies e ele “era a noiva”. Isso mostrava possíveis indícios de sua orientação sexual. Chamei sua mãe e abordei o assunto de forma clara, mas sutilmente, orientando-a a procurar um psicólogo. Além de não aceitar a abordagem, sentiu-se ofendida. Na sala de aula, abordei o assunto, por exemplo, ao contar a história: “Por que meninos têm pés grandes e meninas têm pés pequenos?”. E novamente abordamos o respeito às diferenças... E como diz neste livro:
“Não importa...
...se os seus pés são grandes ou pequenos,
Nem se você chuta bola ou brinca com bonecas,
Ou os dois, ou até nenhum dos dois,
Nem se você usa sapato rosa ou azul,
Ou até mesmo nenhum dos dois,
Nem se você é menino ou menina.
O que importa mesmo...
...é que os adultos respeitem você...
Que seus pais amem você acima de tudo...
Que não sofra discriminação dos professores...
Que seus colegas e amigos sejam legais...
E que você seja feliz!”
Não vou mentir que os colegas aboliram definitivamente as atitudes homofóbicas, mas sei que o modo como fomos conversando e agindo, na sala de aula, provocaram alterações deveras importantes, a ponto de escutar da mãe do menino ao qual me refiro, que tinha repensado e refletido sobre a nossa conversa do início do ano. Conversara com seu filho, aceitando a seguir a minha sugestão para procurar um psicólogo, através da universidade, pois ela amava o filho e queria tratá-lo com o mesmo respeito com o qual percebeu que eu o tratava... E que precisava de orientações, tanto para ela quanto para o filho, pois reconhecia que, na nossa sociedade, existem muitos preconceitos e necessitava de ajuda para poder lidar com a situação. Só por isto, penso que foi muito válida a realização deste projeto.
Sei que não posso e não devo cessar por aqui, se, realmente, desejo despertar a consciência dos educandos, buscando uma mudança que reflita no seu comportamento, e, assim, atinja seus pais e a comunidade. Sem dúvida, farei disso uma busca permanente na escola!
Reconheço que é muito difícil, na nossa convivência diária com os outros, não fazermos comparações, julgamentos e, por vezes, condenações, baseados única e exclusivamente, na nossa parca ideia e concepção de certo e errado. Seguidamente, não escutamos a opinião, os conceitos, os valores dos outros. É comum, pensarmos que nós somos os “donos da razão” e, muitas vezes, as “vítimas”, os “incompreendidos”, sempre considerando o nosso ponto de vista.
Enfim, este projeto teve uma especial importância primeiramente para mim, pelo exercício de me colocar no lugar do outro, por mexer com meus conceitos, sentimentos, concepções e penso que por isso consegui atingir alguns alunos. Sinto que hoje já não sou a “mesma professora” e por isso continuarei na busca deste sonho, de ampliar as consciências dos educandos, tornando-os agentes transformadores, para a construção de uma sociedade e um mundo melhor.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
· ALVES, Rubem. Alegria de ensinar. São Paulo: Ars Poética, 1994.
· SOARES, Magda. Letramento – um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autentica, 2006.
· FOUCAUBERT, Jean. A leitura em questão. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
· FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2002, 21ª ed.
· A criança de 6 anos, a linguagem escrita e o ensino fundamental de nove anos: orientações para o trabalho com a linguagem escrita em turmas de crianças de seis anos de idade / Francisca Izabel Pereira Maciel, Mônica Correia Baptista e Sara Mourão Monteiro (orgs.). – Belo Horizonte : UFMG/FaE/CEALE, 2009.
· SOARES, Magda. Parte de palestra proferida na FAE UFMG, e, 26/05/2003, na programação “Sexta na Pós”. Transcrição e edição de José Miguel Teixeira de Carvalho e Graça Paulino.
· SMOLE. Kátia Cristina Stocco. A matemática na educação infantil: a teoria das inteligências múltiplas na prática escolar. Porto Alegre: artmed, 2000.
· PANIZZA, M. Ensinar Matemática na Educação Infantil e nas séries iniciais: análise e propostas. Porto Alegre, Artmed, 2006.
· BRANCO, Sandra. Por que meninos têm pés grandes e meninas têm pés pequenos? São Paulo, Cortez, 2008.